sábado, 10 de maio de 2008

today

Todos os dias são dias.
Não há segunda, terça, quarta e sempre assim até Domingo. Não há dias da semana, só horas de um dia. O de hoje. E eu que sei tão bem qual é o dia de hoje. É a repetição de o de ontem e a réplica do de amanhã. Estou cansada. E eu que sei tão bem o que é estar aqui. Sozinha, neste quarto escuro. No chão frio desta sala cinzenta.

"- É esta a minha casa.
- Ah.
- Queres entrar?
- Não. Eu queria que fosse nossa. Não entro, até que tu me deixes entrar."

Ficámos sempre à entrada de minha casa. Talvez fossem as paredes tão coloridas que te assustassem. Cinzento preto, preto com um bocadinho de branco, branco sujo, vermelho, vermelho sangue. Ou entao talvez fosse o meu medo de veres as cores como elas são. Penso sempre no que possas pensar, ainda não me livrei desta minha mania. Também ainda não me livrei do teu cheiro. Permanece na minha pele. O cheiro que permanece nestas paredes onde nunca estiveste. Ainda me lembro da tua mão a agarrar a minha. A maneira como brincaste com as minhas lágrimas naquele dia de despedida. Não me querias ver chorar, querias que me controlasse. Ainda não tinhas percebido que controlada andei eu todo este tempo... E chorava por já não te ter.
Ando por aí com vontade de abraçar as pessoas. Não é vontade de querer, é vontade porque preciso. Mas não preciso de as abraçar, afinal. Sempre que as vejo não é o olhar que quero ver. Sei então que não é aquele abraço que quero receber. Já pensei em tudo. Já imaginei tudo. Mas nada, nada me dá certezas de que um dia vou conseguir substituir o calor do teu abraço. Como fingir que sim se és tu que nunca mais vais lá estar? Como fingir que vou abrir os olhos, afastar-me, e ver que afinal eras tu? Como. Já não como e já não durmo. Tenho fome de ti. Preciso de te sugar para dentro de mim. Quero que me esqueças para nunca mais te lembrares. Quero que nada disto tenha existido para ti. Quero aprender a ser egoísta, sempre to disse. Acho que já o estou a ser. Quero ser a única a lembrar-se de nós. Quero ficar com todos aqueles beijos só para mim. Quero arranhar a memória para que as trancas automáticas se fechem como segurança. Quero-te aqui sem que me fujas. Não te quero. Mas quero-te.

"- Vamos a tua casa.
- Não.
- Porquê?"

Porque o medo era maior do que eu. Agora já não. Agora é só muito maior do que eu. Ou então fui eu que diminuí. A casa onde estou não teve nunca uma porta por onde possas passar. Talvez tenhas visto esta casa vezes de mais para te teres ido embora da maneira que foste.
Oh, como estou farta desta vida. Devemos ser a mudança que queremos ver, dizem. Dizem, dizem. Dizem. Todos falam sobre tudo e sobre nada. Todos me dizem para lutar e eu já só quero paz.
Vou então deixar-te cá fora e vou entrar. Junto de ti está uma mala. Com a minha vida lá dentro. Pisquei os olhos, e olha! , já foste embora. Sento-me então no degrau desta velha casa. Que já tanto viu e já nada vê. Tem as janelas fechadas, tapadas casa uma com um pano preto. Sento-me então no degrau desta minha casa. O céu sabe a saudade e o vento que sinto no rosco a melancolia. Não vou dizer que te vejo partir, foste embora depressa demais. Imagino então um rapaz alto com jeans e com o teu casaco castanho de cabedal com uma mala na mão a afastar-se, a afastar-se, a afastar-se...

Deixarei alguma vez de te ver?